No mundo do trabalho, o mais comum é quando empresa demite o funcionário por justa causa, não o contrário. Mas sabia que também é possível que o colaborador “demita” a empresa?
Para esse tipo de situação, o termo mais correto é rescisão indireta do contrato de trabalho. Vem saber mais sobre ela!
O que é rescisão indireta?
Para traduzir em um termo popular, a rescisão indireta do contrato de trabalho é como se fosse uma “demissão por justa causa” do empregador. Ou seja, quem aciona o dispositivo é o funcionário contra a empresa.
A ideia, neste caso, é o colaborador pedir seu desligamento alegando uma falta grave por parte do empregador e com o direito de receber as verbas rescisórias. Para isso, o funcionário deve ir até a Justiça do Trabalho fazer essa requisição.
Normalmente, esse pedido de rescisão indireta costuma vir em um “combo” de pedidos de indenização por danos morais, uma vez que a falta cometida pelo empregador deve ser considerada grave.
Apesar da situação parecer incomum, só no primeiro semestre de 2023, a Justiça do Trabalho contabilizou quase 140 mil novos casos de pedidos de rescisão indireta.
Quando a rescisão indireta pode ser pedida?
A medida está prevista no artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e os motivos listados no texto da lei são situações em que:
- Forem exigidos do empregado serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes ou alheios ao contrato;
- Se o colaborador for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
- Se o funcionário correr perigo manifesto de mal considerável;
- Se o empregador não cumprir com as obrigações do contrato;
- Se o empregador ou seus prepostos (quem representa o titular da empresa) praticarem contra o funcionário ou pessoas de sua família ato lesivo da honra e boa fama;
- Se o empregador ou seus prepostos ofenderem o colaborador fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- Se o empregador reduzir o trabalho do empregado, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente os salários.
Apesar de o texto parecer vago em alguns momentos, a Justiça do Trabalho vem interpretando o artigo e reconhecendo algumas situações específicas para garantir o direito à rescisão indireta, como quando o empregador:
- Repetidamente atrasa o pagamento dos salários ou não faz o recolhimento regular do FGTS do trabalhador;
- Não paga as horas extras trabalhadas ou deixa de pagar férias, vale transporte etc.;
- Não fornece equipamento de proteção individual (EPI) e/ou não fornece condições de trabalho seguras;
- Não paga adicional de insalubridade ou periculosidade em casos de atividades laborais que possam trazer algum risco à saúde do funcionário;
- Comete assédio moral (ou, no caso de o assédio vir de colegas de trabalho, quando o empregador não toma as medidas para coibir essa situação);
- Comete atos de agressão física contra o funcionário ou o submete a algum tipo de perigo real;
- Reduz horas de trabalho ou de salário sem fazer um acordo prévio com o empregado.
Caso o colaborador ache que tenha direito a esse tipo de requerimento, não precisa procurar a área de Recursos Humanos da empresa, mas, sim, a Vara do Trabalho mais próxima, munido de documentação e provas para reforçar o seu pedido.
Apesar de a Justiça trabalhista não exigir que o trabalhador tenha um advogado para entrar com uma ação, recomenda-se sempre o auxílio jurídico de um profissional habilitado que pode vir também do sindicato da categoria.
E se a Justiça não reconhecer a rescisão indireta?
Assim como todo processo judicial, o pedido de rescisão indireta também passa por um trâmite que pode demorar um tempo.
E, nesse caso, como fica a rotina de trabalho até a decisão judicial? O empregado segue trabalhando ou se afasta de suas atividades, presumindo que o contrato de trabalho já está rescindido?
Essa é uma situação delicada, pois, caso a Justiça julgue o pedido improcedente, pode-se configurar uma situação de abandono de emprego e o funcionário será demitido em justa causa, sem receber as verbas rescisórias.
O ideal é que a ação seja ajuizada enquanto o empregado ainda está trabalhando, e assim continuar até sair a decisão para evitar que se caracterize como um abandono de emprego.
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no entanto, tem entendido que esse comportamento, por si só, não configura abandono de trabalho que justifique uma justa causa.
“A razão é que a ausência do empregado para pedir a rescisão indireta do contrato de trabalho constitui o exercício legítimo de um direito previsto em lei. Isso significa que o afastamento não demonstra a intenção de simplesmente abandonar o emprego, mas de buscar, de acordo com as normas legais, o término do vínculo em razão de circunstâncias que tornam a sua continuidade insustentável. Essa distinção é fundamental para garantir que o empregado não seja injustamente penalizado por buscar seus direitos nos termos da legislação trabalhista”, diz o tribunal.
O mesmo vale para o aviso prévio. Em situações normais, quando um trabalhador decide pedir demissão de forma voluntária, ele deve cumprir o aviso, salvo a dispensa expressa do empregador. No entanto, o TST entende que a abertura de uma ação trabalhista com pedido de rescisão indireta dispensa o cumprimento do aviso prévio.
“Nesse contexto, mesmo que o pedido seja indeferido, ele não terá de compensar o aviso prévio com as possíveis verbas rescisórias de responsabilidade do empregador”, explica o texto do tribunal trabalhista.
Em casos de pedidos de rescisão indireta, a empresa costuma demitir logo o funcionário e pagar as verbas rescisórias para evitar tais situações.
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