Imagine a seguinte cena: você se levanta da cadeira em que estava sentado há, no mínimo, quatro horas. Atravessa o corredor, prepara a cápsula de café, direciona o olhar para a janela mais próxima e é literalmente conduzido a um momento de distração.
Em menos de cinco segundos, espécies de “abas” mentais começam a surgir. “Preciso dar parabéns à Fabi.” “Não respondi o último e-mail de vendas.” “A ração do gato está acabando.” “O que será que vamos jantar hoje?” “O WhatsApp está acumulado.” “Será que amanhã vai ter vacina?” “Só queria sumir…”
Acostumada à velocidade e a estímulos constantes, sobretudo aqueles mediados por telas, a nossa sociedade já conquistou títulos nada elegantes – da sociedade do cansaço até a cultura da produtividade, passando pelo excesso de positividade até o enaltecimento da exaustão.
A literatura é vasta, mas o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han foi quem mergulhou no tema para construir a seguinte argumentação: estamos acostumados a sermos sempre produtivos e temos a ilusão de que todas as metas devem ser sempre alcançáveis.
Mas é justamente esse modus operandi da sociedade contemporânea que condena qualquer necessidade de pausa, descanso ou uma mera desaceleração.
O resultado de tudo isso? Desaprendemos a fazer nada. Ou pior, nos culpamos por precisar de um tempo livre, dissociado de qualquer ideia de atividade produtiva.
Construímos uma fortaleza sob a cultura “workaholic sempre conectada”, em que prevalece o mito do excesso de pressão e de cansaço como estratégia para um melhor rendimento.
Mas não deveria ser assim.
Quando o descanso está longe de ser mera procrastinação
“As pessoas não conseguem entender que merecem o descanso, seja pela internalização tão grande das cobranças, ou até por questões de padrão de saúde mental, em que a pessoa não consegue se desligar”, explica o psicólogo da Alice Fábio Munhoz, especialista em terapia cognitiva e psicologia positiva.
“Por isso a importância de construir estratégias que sejam significativas para cada pessoa se engajar. Não é só pausar o trabalho; isso não indica que você vá se desligar da preocupação. É realmente se distanciar e mudar o foco da atenção”, detalha.
Pesquisas já demonstraram que pequenas pausas no dia a dia, principalmente para os profissionais que trabalham em frente a telas, são super significativas para o desempenho e a melhoria da saúde mental.
De acordo com os dados estudados, o melhor desempenho não é reflexo de uma cultura de cobrança exaustiva, mas de um contexto que traga conforto ao indivíduo, como a ergonomia correta e a inclusão de pequenos exercícios de alongamento e respiração à rotina.
E há também o que alguns autores chamam de “pausas ativas”. Realizar pequenas caminhadas, ou até mesmo uma atividade física, assim como incluir alguma interação social ao longo da jornada de trabalho melhora os níveis de estresse e desconforto.
Em um contexto de trabalho remoto, o grande desafio, segundo Fábio Munhoz, é não dedicar os momentos de descanso longe do computador a um outro tipo de tela, como a interação em redes sociais nos smartphones.
“Ter um local propício para o trabalho e saber diferenciá-lo do descanso é super importante para quem está trabalhando de casa. Cada um precisa saber o que permite a desconexão com as preocupações do trabalho, bem como a sensação de repouso e lazer”, diz o especialista.
Desaprendemos a lidar com o ócio?
Quando falamos em descanso, a primeira imagem que temos é a cena contemplativa de fugir para a praia ou para a montanha e simplesmente se abster de qualquer pensamento perturbador.
É óbvio que estar perto da natureza e longe da rotina traz benefícios ao nosso descanso, mas nem sempre essa situação é possível. Aqui, cabe um exercício de “resistir no lugar”, ou seja, de construir oportunidades onde quer que a gente esteja para nos sentirmos conectados com o descanso de alguma forma.
“A atenção plena é a nossa capacidade de estar presente; às vezes a gente reserva o tempo para o descanso e simplesmente não consegue estar presente. Precisamos desenvolver a nossa capacidade de viver o momento atual”, diz o psicólogo.
Essa construção pode se dar por meio de um exercício de respiração e até meditação. Mas não só. Segundo o especialista, precisamos dominar a capacidade de lidar com os pensamentos invasivos e repetitivos, as tais das “abas mentais”, que nos afastam do descanso pleno.
“Quando esse tipo de pensamento se torna uma perturbação, é importante saber buscar um suporte profissional. A preocupação, o estresse, todos esses sentimentos são normais e fazem parte da nossa vida, mas quando isso se torna patológico, ou seja, quando os pensamentos se tornam invasivos a ponto de serem incapacitantes de alguma forma, essa é a hora de pedir ajuda”, complementa.
E aí, você já descansou hoje?
8 Dicas de pausas restauradoras para incluir na sua rotina
- Ouvir música
- Fazer alongamentos
- Realizar caminhadas curtas
- Tomar banho no meio do expediente
- Se dedicar a atividades manuais
- Fazer uma leitura
- Conversar com algum amigo
- Preparar uma refeição
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