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Saúde masculina: entenda por que os homens vivem menos

A masculinidade tóxica pode estar por trás da falta de cuidados com a saúde masculina {e dos anos de vida a menos}. Como melhorar este quadro? Entenda.

Ana Araujo
| Atualizado em
7 min. de leitura
Diversos homens de costas em uma multidão

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No geral, as mulheres vivem mais do que os homens. Só no Brasil, a expectativa de vida média do sexo feminino é de 80 anos, enquanto a do sexo masculino é de 73, segundo os últimos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Tanta diferença intriga os pesquisadores há décadas. Será que é só uma questão biológica? 

Nos anos 1990, pesquisadores apontaram que algumas diferenças hormonais e nos cromossomos poderiam ter a ver com isso. Uma das teses é que uma ação dos hormônios levaria os homens a acumularem mais gordura visceral (que fica ao redor dos órgãos) do que as mulheres, o que poderia predispô-los mais a doenças do coração, diabetes, entre outras.

Mas só esses fatores biológicos ainda não contavam a história toda. Conforme os estudos foram avançando e abraçando mais campos da ciência, foi ficando mais claro que as diferenças iam muito além.

Só a biologia não explicaria por que, só no Brasil, homens têm 3,8 vezes mais risco de morte por suicídio do que as mulheres, segundo o Ministério da Saúde. Eles também morrem mais de 10 vezes mais do que as mulheres por causas violentas, de acordo com o Atlas da Violência, do Ipea

Se incluirmos o fator racial na conta, a situação piora: homens negros têm 10 vezes mais chances de morrer por violência armada do que homens brancos, aponta o órgão estadunidense CDC (Centers for Disease Control and Prevention).

Percebe que, seja de morte morrida ou matada, a longevidade dos homens acaba sendo mais afetada? Essa questão virou até tema de páginas de humor na internet, que postam vídeos de homens se arriscando em situações nitidamente perigosas {apesar de não ter graça nenhuma}. 

Juntando todas essas evidências, os pesquisadores começaram a entender que fatores socioculturais e comportamentais também entravam nessa equação. 

“Tantas mortes têm a ver com comportamentos mais encorajados ou aceitos em homens do que em mulheres na nossa sociedade. Por exemplo, uso de armas, ser aventureiro e agir sem medo, trabalhar em empregos perigosos, tabagismo ou uso abusivo de álcool”, diz Fábio Roberto Munhoz dos Santos, psicólogo da Comunidade de Saúde da Alice.

Síndrome do Super Homem = menos cuidados com a saúde do homem

Ser homem na nossa sociedade tem muito a ver com a forma que se lida com a própria saúde e os sentimentos.

Os meninos são criados ouvindo que não podem chorar. Conforme crescem, pede-se que eles provem sua masculinidade. Não basta ser humano: é preciso ser um “Super Homem”, explica Santos.

Rafael Pereira, médico de família e comunidade e membro do time de HealthEx da Alice, que pesquisou a relação entre masculinidades e saúde em seu mestrado, conta que a nossa sociedade enxerga o homem como um ser viril, destemido, racional e orientado para o trabalho, especialmente pela condição de “provedor da família”. 

“Então, para ser ‘homem’, não basta ter que demonstrar força, tomar riscos exagerados e trabalhar extenuantemente. A eles também está interditado falar sobre emoções, cuidar de si ou mesmo buscar ajuda quando preciso.”

É uma via dupla para lá de nociva: do mesmo jeito que essa noção de masculinidade favorece comportamentos prejudiciais, também bloqueia a busca por ajuda e cuidado.

Não à toa é comum encontrar homens que nem sequer marcam suas próprias consultas — deixam isso para suas mães, esposas, secretárias, filhas e outras mulheres do seu convívio. “Socialmente, o cuidar é visto como tarefa feminina”, pontua Santos.

Esse conjunto de comportamentos e expectativas é tão danoso para a sociedade que até ganhou nome: masculinidade tóxica. 

A OMS (Organização Mundial da Saúde) já jogou luz sobre o termo {e suas consequências} em um relatório, afirmando com todas as letras que “a masculinidade tóxica influencia a saúde e a expectativa de vida dos homens nas Américas”. 

Ela seria responsável pelas maiores taxas de suicídio, de homicídio, vícios e acidentes de trânsito, assim como pelo surgimento de doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão e diabetes.

“Isso [a masculinidade tóxica] não apenas afeta a saúde dos próprios homens mas também leva a resultados negativos para mulheres e crianças em termos de violência interpessoal, infecções sexualmente transmissíveis, gravidez imposta e paternidade ausente“, escreveu a OMS.

Desafios da saúde mental masculina

Os ideais de masculinidade impostos vêm prejudicando não apenas o corpo mas também a mente dos homens. O estigma em torno da saúde mental é ainda pior entre os homens, segundo relatório da OMS. 

“Apesar das altas taxas de transtornos ansiosos e depressivos, eles são menos propensos a buscar e receber apoio formal de saúde mental”, comenta o psicólogo da Comunidade de Saúde da Alice.

Essa relação já foi explorada por um estudo canadense publicado no jornal científico Community Mental Health Journal. Os pesquisadores afirmaram que “o estigma sobre a depressão e suicídio entre homens pode restringir a busca por ajuda, reduzir a adesão ao tratamento e impedir que os indivíduos confiem em amigos e familiares.”

Dicas de saúde masculina para virar o jogo

Desatar tantos {e antigos} nós é tarefa da sociedade como um todo, mas pode começar individualmente.

Para o médico de família Rafael Pereira, não existe só uma forma de ser homem. Reconhecer isso é o primeiro passo para entender como as imposições sobre o que é “ser macho de verdade” estão afastando a pessoa de se cuidar para ter uma vida plena e saudável.

“Alguns chamam esse processo de ‘desconstrução’, mas prefiro chamar de ‘reconstrução’”, pondera.

Na prática, isso pode se traduzir em pegar o celular e marcar uma consulta ou exame — e não mais depender de uma mulher para fazer isso.

“Ter um papel ativo na sua saúde e no seu cuidado aumenta as chances de engajamento em comportamentos saudáveis”, justifica Pereira.

Também é preciso aceitar sua própria vulnerabilidade. “Enquanto não aceitamos que somos imperfeitos, não estamos prontos para agir de forma madura e buscar o suporte necessário diante de alguma situação perturbadora ou de um desafio de saúde”, defende o psicólogo Fábio Roberto Munhoz dos Santos.

Pereira aconselha tomar um tempo para observar seus próprios padrões de comportamento — e falar abertamente sobre eles com amigos e familiares. 

Um papo sobre começar uma nova atividade física cabe perfeitamente na roda sobre futebol, por exemplo. Seus cuidados para evitar o diabetes podem entrar na conversa sobre o chope do fim de semana. 

O próprio Novembro Azul pode ser um gancho bacana para essas conversas — até porque essa data vem extrapolando a questão do câncer de próstata para se tornar uma forma incentivar os homens a cuidarem mais da própria saúde.

E, se alguém te chamar de “mala”, bem… Antes um “mala” saudável do que um pentelho que cuida mais da vida dos outros do que da própria, certo? 

No final das contas, tanto faz o gênero: quando o calo aperta, é preciso parar e cuidar dessa dor. Homens que aprendem essa lição podem viver mais {e melhor}.

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