“Pessoas, pessoas, pessoas”. Repetir a palavra “pessoas” para si mesma várias vezes antes de entrar no palco é uma das estratégias da escritora norte-americana Brené Brown para conter o nervosismo antes de uma palestra.
Foi o jeito que ela encontrou para sempre ter na cabeça que vai falar com seres humanos e não com os títulos e os cargos dos profissionais que estão na plateia.
Pode parecer surpreendente que mesmo ela, que já foi assistida por milhões de pessoas {literalmente} por causa do TED Talk “The Power of Vulnerability”, ainda não suba em um palco sem aquele frio na barriga e fale abertamente sobre isso.
Mas abraçar a vulnerabilidade é o principal ensinamento da professora da Universidade de Houston, que pesquisa o tema há mais de duas décadas. Autora de best-sellers como “A Coragem de Ser Imperfeito” e “Mais Forte do que Nunca”, seus estudos são referência em assuntos como vergonha, coragem e empatia.
E ela defende que trabalhar essas emoções é fundamental para as lideranças de hoje em dia.
Por isso, com base nos livros, vídeos, entrevistas e podcasts, fizemos uma seleção de insights da autora para quem deseja comandar equipes de alta performance ou influenciar pessoas com coragem, propósito e confiança.
A coragem para liderar
Brown explica que a maior parte dos líderes tem medo de se expor ou de errar. Mas o problema é que esse receio impede que as grandes ideias e projetos sejam aperfeiçoados ou postos em prática.
A partir de milhares de entrevistas, a autora concluiu que não há pessoas suficientes assumindo riscos inteligentes ou criando e compartilhando ideias ousadas.
Por medo das críticas, a maioria prefere deixar as coisas como estão e seguir o pensamento de grupo.
Porém, para atender demandas em constante evolução, é preciso ter coragem de ser vulnerável. Isso significa deixar de lado a ideia de vencer ou perder e ter clareza de que, ao fazer algo novo, não é possível prever ou controlar o resultado.
A pesquisadora ressalta que a vulnerabilidade não tem a ver com fraqueza, mas com incerteza, risco e exposição emocional.
Ela explica melhor: “Se você vai ousar grandemente, você vai tomar porrada em algum momento. Agir com coragem é também conhecer o fracasso, a decepção, o revés e até a desilusão”, diz Brown em “A Coragem Para Liderar”.
Transparência e autenticidade
No topo da lista de obstáculos em diversos trabalhos, está a dificuldade em estabelecer relacionamentos verdadeiros e transparentes no ambiente profissional.
Segundo Brown, muitas pessoas em posição de liderança evitam conversas difíceis e têm dificuldade em dar feedbacks honestos e produtivos. Frequentemente, a ideia de ser simpático e educado é usada como desculpa.
Só que as consequências dessa postura incluem falta de clareza e a redução da confiança e do comprometimento. Além disso, comportamentos problemáticos tendem a crescer, levando ao aumento de intrigas e fofocas.
E são justamente essas situações que tomam boa parte do tempo e da energia das lideranças. Em vez de estarem focados no aprimoramento do time e no alcance de resultados, muitos gestores acabam ficando empacados ao resolver contratempos, esclarecer decepções e gerenciar conflitos.
“Eu defino líder como alguém que assume a responsabilidade de encontrar potencial em pessoas e processos, e que tem coragem de desenvolver esse potencial”, descreve Brené Brown em um podcast sobre o tema.
Para estabelecer vínculos e propósitos comuns, a coragem deve ser desenvolvida como habilidade. As conversas precisam ser assertivas e sinceras, num contexto em que as vulnerabilidades são aceitas.
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Cultura da coragem x Cultura do perfeccionismo
Em seus estudos, Brown identificou que a falta de comunicação clara cria uma cultura tóxica, em que o desrespeito, a desvalorização das pessoas e a falta de integridade podem prevalecer.
Esse seria, inclusive, um dos principais motivos da atual onda de demissões no mercado de trabalho, que recebeu o nome de Great Resignation.
Para a professora, o caminho para uma transformação organizacional rumo a uma cultura de coragem está na valorização das conexões humanas.
“Se não tivermos um sentimento de carinho por alguém que lideramos ou não nos sentirmos conectados a essa pessoa, há duas opções: desenvolver o carinho e a conexão ou dar lugar para um líder que seja mais adequado”, afirma Brown no livro “A Coragem para Liderar”.
Ela acredita que líderes que comandam à base do medo e da vergonha são ultrapassados e que não há vergonha em liderar com o coração. Para que a inovação possa florescer, é importante oferecer um ambiente em que erros e fracassos sejam tolerados. Além disso, o perfeccionismo não pode se sobrepor ao desenvolvimento.
“Faço todo esse trabalho de liderança em organizações onde as pessoas não conseguem esse relacionamento e constroem intencionalmente culturas perfeccionistas. E então eles dizem: ‘Não há inovação ou criatividade. O que está acontecendo?’ Bem, a vergonha mata a criatividade e a inovação. O perfeccionismo é um mecanismo de defesa contra a vergonha. Se pareço perfeita, posso evitar ou minimizar a vergonha, o julgamento e a culpa”, explica Brown em entrevista à apresentadora Oprah Winfrey.
Para o desenvolvimento de uma cultura de engajamento sincero, o ponto de partida é, novamente, a aceitação da vulnerabilidade.
“Temos a responsabilidade de nos expor, de admitir nossas emoções no trabalho. Líderes corajosos não se calam diante de coisas difíceis. Nosso trabalho é escavar o não dito. E isso requer coragem e vulnerabilidade”, diz ela no documentário The Call to Courage, disponível na Netflix.
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