Vira e mexe, alguns alimentos ou ingredientes ganham o papel de “vilão” das dietas.
Com isso, são “vetados” de muitos cardápios em nome de uma pretensa alimentação “mais saudável” ou com o objetivo de emagrecer.
O glúten ganhou essa fama há alguns anos e foi acompanhado de uma infinidade de produtos e receitas “gluten free”.
Desde 2004, segundo os dados de um documento elaborado pela Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição, as vendas dos produtos sem glúten cresciam em torno de 30% ao ano.
E isso aconteceu apesar de não ter sido registrado, naquele período, nenhum aumento correspondente na incidência de alergia ao glúten – apenas o crescimento da “má fama”.
Hoje é mais conhecida a orientação de que não é preciso eliminar o glúten da dieta se você não tiver nenhum tipo de intolerância ou sensibilidade a ele.
Naquele mesmo documento, a entidade deixa claro que não há evidências suficientes para pressupor que pessoas saudáveis tenham qualquer benefício de uma dieta sem glúten.
Sem falar que ela não acarretaria, por si só, uma perda de peso – seja em pessoas intolerantes ao glúten ou não.
E, pior, há malefícios na microbiota intestinal em pessoas saudáveis que devem ser levados em consideração.
Quer ter uma alimentação sem glúten, mesmo sem precisar? Compense ingerindo outros grãos integrais (como quinoa, aveia e amaranto) e hortaliças com baixa densidade energética (grãos cozidos, por exemplo).
O que é o glúten?
Glúten é o nome dado a um grupo de proteínas que estão presentes em alguns grãos, como os de trigo, cevada {alô, cerveja} e centeio.
Duas das principais proteínas que formam o glúten são a glutenina e a gliadina, e são elas que garantem a elasticidade das massas feitas com os grãos.
É por isso que massas, bolos e pães feitos com farinha de trigo (que tem glúten) têm uma textura “fofinha” e bem palatável para o consumo, explica Juliana Malafaia, nutricionista da Alice.
O que é a intolerância ao glúten?
Há três tipos de intolerância ao glúten:
- Doença celíaca: quando o sistema imune ataca a parede do intestino quando recebe algo com glúten.
- Alergia: quando a pessoa tem sintomas de alergia pelo corpo todo devido ao contato com o glúten.
- Sensibilidade: quando há dificuldade de digestão do glúten.
Doença celíaca
Trata-se de uma doença autoimune e genética que faz com que determinadas pessoas, ao entrarem em contato com o glúten, tenham a parede do intestino atacada pelo sistema imunológico, causando lesões locais que podem ser graves.
Estudos internacionais estimam que 1% da população mundial tenha a doença celíaca, embora muitos casos não sejam diagnosticados.
Os sintomas mais comuns são:
- Problemas gastrointestinais (vômito, diarreia, inchaço, gases etc.);
- Dores nas articulações;
- Dores de cabeça.
Se, mesmo com o diagnóstico, a pessoa continuar com uma dieta rica em glúten, poderá gerar alterações nas células da parede do intestino que vão se atrofiando. Isso pode causar úlceras e aumentar o risco de desenvolvimento de câncer.
Alergia ao glúten
É um alergia alimentar igual qualquer outra. Isso significa que, ao expor o organismo ao glúten, o sistema imunológico vai se mobilizar para atacá-lo, gerando sintomas respiratórios, de pele, gástricos (vômito, diarreia, inchaço, gases), intestinais, entre outros.
Diferente da doença celíaca, não há um autoataque do intestino, mas há uma reação alérgica, que pode gerar sintomas por todo o corpo, e não em um local específico.
No caso da alergia, também não há o processo de degradação das vilosidades do intestino, como acontece na doença celíaca.
Sensibilidade ao glúten
É uma terceira situação em que a pessoa não possui uma boa digestão daquelas proteínas, causando algumas reações também. É aquela situação em que a pessoa consome o alimento, mas sente que não caiu tão bem.
Tal condição ainda não possui explicações claras, mas também pode ter um componente genético, explica Malafaia.
Os sintomas se resumem aos gastrointestinais (vômito, diarreia, inchaço, gases etc.).
Como saber se sou intolerante ao glúten?
Seja doença celíaca, alergia ou sensibilidade, o primeiro passo é observar se os sintomas listados acima aparecem depois de ingerir alimentos com glúten.
Para se chegar ao diagnóstico da doença celíaca, são avaliados:
- Histórico familiar de casos;
- Exame de sangue para verificar a presença dos anticorpos que indicariam a alteração no gene;
- Biópsia da parede do intestino para ver se há algum tipo de lesão.
No caso do diagnóstico da alergia, também são observados:
- Exame de sangue para checar a presença dos anticorpos;
- “Prick test”, teste em que a pele do paciente recebe pequenos furinhos sobre os quais são administradas gostas dos potenciais alergenos para verificar a reação do corpo.
Para avaliar a sensibilidade ao glúten, o exame de sangue não é o mais indicado, pois muitas pessoas não apresentam os anticorpos, explica a nutricionista. Neste caso, o mais indicado é fazer a exclusão do glúten da alimentação e observar se ocorre uma melhora dos sintomas intestinais.
“[Diante dos sintomas] é interessante procurar um profissional para avaliar se é uma intolerância ao glúten ou se é outra alergia alimentar. O médico que vai cuidar disso é o gastroenterologista ou o alergista. Junto com o nutricionista, será feita uma investigação para entender em qual dos três tipos de possíveis intolerâncias a pessoa se encaixa”, explica Malafaia.
Como é o tratamento?
Independentemente dos casos, o tratamento se resumirá essencialmente à retirada do glúten da dieta.
No entanto, em quadros de doença celíaca a pessoa também precisa passar por um exame para avaliar como está a mucosa do intestino. Isso porque ela pode ter sofrido alguma lesão e aí o tratamento se adapta a esse cenário.
“Vemos com frequência grandes marcas produzindo produtos sem glúten, como cerveja e mix de farinhas específicas para fazer bolo ou mesmo pães. Geralmente, a farinha sem glúten é mais seca, sem toda aquela elasticidade. Normalmente, as pessoas misturam farinha de arroz ou amido de milho para chegar em uma combinação que dê um pouco mais de textura, sobretudo em receitas de panificação. Também já encontramos opções de macarrão, biscoito e granola sem glúten”, lista Malafaia.
A nutricionista lembra que, por lei, as fabricantes são obrigadas a destacar a lista dos ingredientes nas embalagens dos produtos e sinalizar se o alimento contém glúten.
“É uma legislação especialmente interessante para as pessoas que têm a doença celíaca, porque às vezes elas consumiam alimentos contaminados que geram a reação autoimune e cria lesões graves na parede do intestino. Então, se alguém tem alguma dúvida, é só olhar o rótulo que vai estar escrito.”
Glúten engorda?
Não existem evidências científicas que mostrem a necessidade da retirada de glúten das dietas para a perda de peso de pessoas que não tenham nenhum tipo de intolerância, salienta Malafaia.
“Virou moda tirar glúten porque as pessoas percebiam que, a partir do momento em que você faz essa restrição, acaba tendo escolhas alimentares mais saudáveis. Ao invés de a pessoa comer um prato de macarrão, hambúrguer ou pizza, ela optava por alimentos mais saudáveis. O que emagrece, portanto, é a melhora nas escolhas alimentares. Além disso, alimentos sem glúten não são necessariamente mais saudáveis”, conclui.
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